quarta-feira, 19 de novembro de 2014


A DITADURA DA MASSA PODRE

Por Jeffis Carvalho


Ilustração de Osvaldo Pavanelli

      É muito bom saborear aquelas sobremesas da pâtisserie francesa, em que há uma combinação perfeita entre massa e recheio. Aí, a chamada pâte brisée, ou seja, a massa podre, é simplesmente essencial. Fico “diboa” também com algumas tortas e quiches em que ela impera e nem se admite discussão. Nada contra, portanto.
      A minha implicância é simples: atualmente, há uma verdadeira ditadura da massa podre, pelo menos na cidade de São Paulo, onde vivo. Faça um teste: vá à padaria mais próxima da sua casa e peça uma empadinha de palmito; ou tente uma torta de frango daquelas que sempre figuram no balcão aquecido e são servidas em pedaços. Ou dê um pulo na rôtisserie do seu bairro, ou mesmo no supermercado. Arrisque até mesmo uma loja de congelados. O resultado, garanto, será sempre o mesmo: tortas de palmito ou de frango, empadas, empadinhas ou empadões, todos eles, sem exceção, feitos de massa podre.
      Cadê aquela deliciosa torta de palmito com ervilhas, como a feita pela minha mãe, que eu saboreava na infância? Onde estão as empadinhas de camarão ou de palmito que qualquer padaria paulistana exibia? Sumiram, desapareceram. Sei disso porque corri atrás, pesquisei, busquei no Google, telefonei, comprei e experimentei. A boa e velha massa de torta e de empada está quase extinta. Ela foi substituída pela massa podre, talvez na tentativa de sofisticação da nossa culinária – afinal, a cozinha francesa é imbatível nesse quesito.
      Mas falta esclarecer: se todo mundo sabe o que é a massa podre, qual é a massa pela qual estou travando uma batalha, tentando alistar combatentes? É aquela simples, talvez caipira mesmo, feita à base de farinha, água, sal e um pouco de óleo. Nada de manteiga nem gordura hidrogenada. É uma massa que você morde e não se esfarela, não se quebra nem é gordurosa. De bater os olhos já a identificamos: as pinceladas da gema do ovo conferem-lhe um brilho muito especial. O grande segredo é controlar a sua maciez, o que se garante quando se abre a massa com um rolo. Quanto mais fina e consistente, mais ela é macia, saborosa e quase crocante.
      Nada contra a massa podre. Não quero ser o chato. Só desejo, com certeza, aquela massa deliciosa das empadas e das tortas de antigamente, que minha mãe, minhas tias e minha avó faziam. Onde elas estão? Alguém viu por aí?

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